Na noite de 3 de dezembro de 2025, a CCJ da Câmara dos Deputados aprovou, em caráter terminativo, o PL 3.640/2023, que estabelece novas regras para o regime jurídico das ações de controle concentrado de constitucionalidade no STF. Em seguida, a Câmara rejeitou recurso que tentava levar o texto ao plenário — com 344 votos contra o recurso e 95 a favor — o que assegura o encaminhamento direto do projeto ao Senado.
A votação ocorre num momento de forte comoção institucional. Pela manhã do mesmo dia, o ministro Gilmar Mendes concedeu uma liminar determinando que somente a Procuradoria‑Geral da República (PGR) pode propor pedidos de impeachment contra ministros do STF — decisão que, se confirmada, restringiria a prerrogativa prevista na lei de 1950 de que “qualquer cidadão” poderia denunciar magistrados.
Para muitos parlamentares, a aprovação do PL 3.640/2023 representa uma resposta institucional a esse tipo de decisão monocrática, buscando reforçar o caráter colegiado das deliberações do STF e limitar o alcance de decisões individuais com grande impacto político e jurídico.
Principais pontos do Projeto de Lei 3.640/2023
O PL 3.640/2023 introduz várias mudanças estruturais na maneira como o STF deverá conduzir ações de controle de constitucionalidade — especialmente em relação a decisões monocráticas e controle institucional. Entre os elementos centrais da proposta:
- Limitação às decisões monocráticas: quando um ministro do STF proferir uma decisão individual (monocrática), ela deverá ser obrigatoriamente submetida ao Plenário ou à turma da Corte na sessão seguinte. Se esse reexame não ocorrer, a decisão perde validade
- Obrigatoriedade de motivação: decisões monocráticas precisarão ser justificadas, com explicitação das razões de urgência ou gravidade que levaram à deliberação individual.
- Uniformização do rito para ações de controle concentrado: O projeto regula todas as principais ações dessa natureza (Ação Direta de Inconstitucionalidade — ADI; Ação Declaratória de Constitucionalidade — ADC; Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental — ADPF; e Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão — ADO), definindo prazos, regras para manifestações da Advocacia‑Geral da União (AGU) e da PGR, critérios para audiências públicas e participação de terceiros interessados (amici curiae).
- Quórum qualificado para modulação de efeitos: para que o STF module os efeitos de suas decisões (ou seja, defina quando e como uma decisão passa a valer), será exigido quórum de dois terços dos ministros (isto é, oito votos), substituindo a proposta inicial de maioria simples.
- Restrição aos “autores legítimos”: o projeto define expressamente quem pode propor ações diretas no STF — e exclui partidos nanicos e entidades sem abrangência nacional ou sem critérios formais definidos. Entre os legitimados estão: presidente da República; mesas da Câmara e do Senado; governadores; a mesa de assembleias legislativas ou da Câmara Distrital; o Ordem dos Advogados do Brasil (OAB); partidos que tenham alcançado a cláusula de barreira; e confederações sindicais ou entidades de classe nacionais com pertinência ao tema.
- Limitação de decisões “normativas” e “estruturantes”: a proposta veda que o STF edite decisões com efeitos normativos ou estruturantes — isto é, que criem “novas normas” provisórias, ou determinem políticas públicas ao Executivo, ou modifiquem a estrutura normativa ou administrativa do Estado. Isso coloca freios à ideia de que o STF “pode legislar” ou “governar” por meio de suas decisões.
Impactos esperados e debates
O PL 3.640/2023 vem sendo interpretado por seus defensores como um instrumento de fortalecimento da colegialidade do Judiciário e de preservação do equilíbrio entre os Poderes. Ao exigir que decisões monocráticas sejam submetidas ao Plenário, com justificativa e prazo, a proposta busca impedir que normas aprovadas pelo Legislativo sejam suspensas ou modificadas por atos individuais com efeitos duradouros — muitas vezes em meio a controvérsias políticas
Para críticos, no entanto, o projeto representa uma limitação importante à autonomia do Judiciário — podendo fragilizar a capacidade da Corte de agir com agilidade em situações de urgência ou risco de grave lesão a direitos fundamentais. Há também argumentos de que a restrição a autores de ações diretas poderá diminuir o acesso ao STF, especialmente para partidos menores ou entidades da sociedade civil, restringindo o pluralismo institucional.
Com a aprovação na CCJ e o envio ao Senado Federal, o PL 3.640/2023 entra agora numa nova etapa. Se convertido em lei, deverá provocar mudanças significativas na forma como o STF julga o controle de constitucionalidade — e na dinâmica entre os Poderes no Brasil.
Ligação com a decisão recente de Gilmar Mendes
A coincidência temporal entre a aprovação do PL e a decisão do ministro Gilmar Mendes — que restringiu a possibilidade de impeachment de ministros do STF apenas à PGR — intensificou o debate sobre os limites da atuação monocrática da Corte. Muitos parlamentares viram na proposta legislativa uma reação a decisões unilaterais com impacto institucional e político.
Nesse contexto, o PL 3.640/2023 não aparece meramente como uma mudança técnica no rito de controle de constitucionalidade, mas como um instrumento de reafirmação do papel do Congresso Nacional e do princípio do colegiado dentro do sistema institucional brasileiro.



