TCU: O relógio de Lula e o caso das jóias de Bolsonaro

O diretor-geral da Polícia Federal, Andrei Rodrigues, avaliou que a decisão do Tribunal de Contas da União (TCU) sobre um relógio dado ao presidente Lula (PT) em 2005 não interfere no posicionamento da investigação sobre o caso do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e seus aliados.

Mas juristas afirmam que interfere sim. “A decisão do TCU, mesmo sendo um retrocesso moral, impede acusação criminal contra Bolsonaro”, disse Janaína Pascoal.

O TCU

“O TCU apenas reconheceu que não cabe àquela Corte de Contas decidir sobre incorporação de presentes recebidos por Presidentes da República, enquanto não houver lei específica, remanescendo, portanto, a competência do Sistema de Justiça Criminal”, disse Rodrigues em nota a O Globo.

Não há, assim, interferência no posicionamento que a Polícia Federal já adotou em sede de investigação, remanescendo os encaminhamentos a serem dados pela Procuradoria-Geral da República e pelo Supremo Tribunal Federal em seara penal”, acrescentou.

Como foi a decisão do TCU?

Segundo o entendimento do ministro Jorge Oliveira, que liderou a maioria, “não há crime sem lei anterior que o defina. Agora, diante da inexistência da norma, estou afirmando categoricamente que até o presente momento não existe uma norma clara que trate de recebimento de presentes por parte de presidentes da República e na ausência da norma. Não me cabe legislar”.

Oliveira foi acompanhado pelos ministros Vital do Rêgo Filho, Aroldo Cedraz, Jonathan de Jesus e Augusto Nardes.

A decisão também agrada à defesa de Jair Bolsonaro no caso das joias sauditas. O ex-presidente foi indiciado pela Polícia Federal por peculato, associação criminosa e lavagem de dinheiro.

Dois dos ministros que votaram pela liberação de Lula, Jonathan de Jesus e Augusto Nardes, foram indicações da gestão Bolsonaro.

Os únicos votos divergentes foram o do relator, ministro Antonio Anastasia, e do ministro-substituto Marcos Bemquerer, que ainda assim defenderam que Lula mantivesse o relógio mas sem abrir precedente favorável ao ex-presidente.

TCU só será coerente se obrigar Lula a entregar relógio, por Carlos Graieb

O TCU deve decidir nesta quarta-feira, 7, o destino de um relógio de 60 mil reais que Lula recebeu de presente em 2005, em sua primeira passagem pelo governo. Não há dúvida que a única decisão possível é ordenar que ele seja entregue ao acervo da Presidência. 

Ah, mas isso é punição retroativa! A regra sobre o que presidentes podem ou não levar consigo depois de deixar o cargo só foi estabelecida em 2016! 

Esse argumento é uma falácia. 

O tribunal já requereu a entrega de 568 itens recebidos por Lula em seus mandatos anteriores. Não faz sentido nenhum abrir uma exceção agora.

Fazer Lula entregar à União uma peça valiosa que recebeu como representante do Estado brasileiro não equivale a um castigo. Ele não perderá uma parte de seu patrimônio, pois o objeto nunca foi seu. 

Trata-se também de garantir que, no futuro, o relógio estará no lugar certo, e não no pulso de um desconhecido ou numa loja de penhores no estrangeiro. 

Bolsonaro não é vítima

Advogados e apoiadores de Jair Bolsonaro estarão certos em gritar “falta” se o TCU decidir de maneira diferente. Haverá incoerência e quebra de precedente. 

Ainda assim, não terão o direito de dizer que Bolsonaro é perseguido ou discriminado.  

Ele chegou à presidência em 2018 com uma vantagem em relação a todos os seus antecessores: sabia exatamente o que deveria fazer com os presentes que recebesse na condição de chefe de Estado. Tinha uma questão a menos com que se preocupar. 

O Tribunal de Contas da União (TCU) havia estabelecido com clareza absoluta, dois anos antes, que presentes caros como joias – o exemplo das joias apareceu de maneira explícita no julgamento – fazem parte do acervo da Presidência. Não servem para  engordar o patrimônio dos ocupantes momentâneos do Palácio do Planalto. Não podem ser vendidos por aquele que recebeu o presente, nem compor a herança de filhinhos e netinhos. 

Bolsonaro e sua turma decidiram fazer de conta que a regra, em vez de clara, era duvidosa. Que o TCU não havia estabelecido de uma vez por todas a natureza de um item de uso “personalíssimo” (camiseta e gravata: sim; relógio cravejado de diamantes: não). 

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